terça-feira, 13 de julho de 2010

"Palavras ao mar



Mar, belo mar, selvagem
Das nossas praias solitárias!  Tigre
A que as brisa da terra o sono embalam,
A que o vento do largo eriça o pêlo!
Junto da espuma com que as praias bordas,
Pelo marulho acalentada,  à sombra
Das palmeiras que arfando se debruçam
Na beirada das ondas -  a minha alma
Abriu-se para a vida com se abre
A flor da murta para o sol do estio.


Quando eu nasci, raiava
O claro mês das garças forasteiras;
Abril, sorrindo em flor pelos outeiros,
Nadando em luz na oscilação das ondas,
Desenrolava a primavera de ouro:
E as leves garças, como folhas soltas
Num leve sopro de aura dispersadas,
Vinham do azul do céu turbilhonando
Pousar o vôo à tona das espumas...


É o tempo em que adormeces
Ao sol que abrasa: a cólera espumante,
Que estoura e brame sacudindo os ares,
Não os sacode mais, nem brame e estoura;
Apenas se ouve, tímido e plangente,
O teu murmúrio; pelo alvor das praias,
Langue, numa carícia de amoroso,
As largas ondas marulhando estendes...


Ah! vem daí por certo
A voz que escuto em mim, trêmula e triste,
Este marulho que me canta na alma,
E que a alma jorra desmaiando em versos;
De ti,  de ti unicamente, aquela
Canção de amor sentida e murmurante
Que eu vim cantando sem saber se a ouviam,
Pela manhã de sol dos meus vinte anos."

(Vicente de Carvalho)

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